Quando o espelho quebra. Aprendi da pior forma o que era mirroring!

quarta-feira, 21 de maio de 2025


O dia em que percebi que não era amor — era apenas reflexo.

Durante semanas, achei que tivesse encontrado algo raro. Daqueles encontros que a gente só vê em filmes ou lê em livros antigos. Um homem de fala mansa, olhar gentil, que me enviava poesias no meio da noite, que citava Shakespeare com a mesma naturalidade com que dizia “good morning”.

Ele parecia me enxergar por inteiro.

E como uma boa poeta que sou, me vi ali, completamente entregue à possibilidade de ser amada na mesma intensidade com que amo. Passei a acreditar que aquele homem — culto, sensível, estrangeiro, quase saído de uma livraria londrina — era a peça que faltava nesse quebra-cabeça que é o amor pra mim.

A ilusão do espelho

Mas aí me deparei com um vídeo que foi como uma lâmina cortando devagar.
Nele, uma especialista dizia: "Mulheres intensas, alto astral, criativas, geralmente caem na mão de narcisistas emocionais. Eles não se mostram de cara. Eles te observam, estudam e replicam seu comportamento. E por isso você acha que encontrou sua alma gêmea. Mas não é. É só um espelho."

Aquilo me paralisou.

De repente, todas aquelas conversas profundas, as poesias trocadas, as promessas sussurradas com sotaque britânico, começaram a fazer outro sentido. Talvez ele nunca tenha me enxergado de verdade — apenas devolvia minha própria luz em reflexo.

Espelhamento (mirroring), no contexto do abuso narcisista, refere-se ao ato de imitar ou refletir os pensamentos, sentimentos e comportamentos da vítima. Envolve o narcisista estudando os gostos, desgostos, preferências e valores da vítima e, em seguida, adotando essas mesmas características.

Era poesia… mas só de um lado

O que mais me doeu foi perceber que a poesia que tanto nos uniu — ele me mandava versos, lia poemas pra mim, dizia que se emocionava com minhas palavras — talvez fosse apenas mais uma tática para me manter encantada.

E como boa poeta, fui caindo.
Caindo nas entrelinhas, nos detalhes, nas metáforas que pareciam sinais de conexão genuína.

Mas poesia, quando é verdadeira, constrói. Ela toca, mas nunca fere.
E o que vivemos, embora parecesse lírico, terminou com silêncio, indiferença e promessas quebradas.

Quando não é amor, é lição

Hoje entendo que ele não me amava. Talvez tenha amado a ideia de ser amado por mim — e isso é bem diferente.

E eu? Eu amei com verdade. Como sempre.
Mas dessa vez, não me culpo por isso.

Eu amei porque sou feita de palavras.
Amei porque acredito no amor — ainda que ele, tantas vezes, venha disfarçado de poesia.

Mas agora eu sei: amor de verdade não confunde, não esconde, não manipula.
Amor de verdade não reflete — revela.